sábado, 12 de dezembro de 2009

Os ricos vivem mais dez anos do que os pobres

Esta notícia foi apresentada, hoje de manhã, pela jornalista do telejornal da RTP1, como uma "curiosidade". Isso mesmo, como uma "curiosidade"!
Os "nossos" representantes na Assembleia da República e no Governo, que continuam a brindar-nos com "nobres" e espectaculares comportamentos sociais e cívicos exemplares; os gestores das grandes empresas que, eventualmente, verão alguns dos seus "curiosos" prémios tributados a partir do próximo ano; e tantos dos nossos chefes oficiais da justiça...
todos estes seres "curiosos" farão parte de que grupo, dos ricos ou dos pobres?...
Deixem-me pensar...
A notícia completa está aqui.

sábado, 26 de setembro de 2009

Absurdos de hoje - 2: Alerta Fome

Esta notícia agora transcrevo-a da Visão, edição de 24 de Setembro, na página 90:

Alerta Fome, uma receita para o desastre
Mata mais que a sida, a malária e a tuberculose juntas. E, pela primeira vez [o sublinhado é meu; quer dizer, a fome está a aumentar, não é?] , atinge um em cada seis habitantes do planeta.
A notícia é tão triste que transcrevo apenas o seguinte:
A cada seis segundos, morre uma criança, devido à fome.
E agora a lista dos países onde o drama é maior, apenas para que conste. Não! É para que não se ignore mesmo! E procure-se saber o que fazem os governantes do mundo com esses países; e o que os próprios governantes desses países fazem (estou, por exemplo, a lembrar-me do que Francisco Louça tem dito sobre os negócios dos governantes portugueses com os governantes angolanos):
  1. Índia
  2. China
  3. República Democrática do Congo
  4. Bangladesh
  5. Indonésia
  6. Paquistão
  7. Etiópia (nestes países, do 1 ao 7, concentram-se 65% das pessoas com fome no Mundo)
  8. Moçambique
  9. Zimbabué
  10. Angola
  11. Zâmbia
  12. Chade
  13. Ruanda
  14. Madagáscar
  15. Tanzânia [quase me arrependo da minha subida ao Quilimanjaro; passei ao lado disto, encantado que fiquei com gente tão afável, educada e sorridente]
  16. Burundi
  17. Eritreia
  18. República Centro Africana
  19. Libéria
  20. Serra Leoa
  21. Togo
  22. Haiti
Sugestão: marquem-se estes países num mapa-mundo; que desenho dará?...

Absurdos de hoje - 1: na Lua

Sem comentários, pura transcrição:

COMPRAR PARCELAS DA LUA É UM INVESTIMENTO APETECÍVEL
O sector imobiliário afunda-se por toda a parte... excepto na Lua. O preço do terreno lunar não cessa de aumentar, diz o jornalista russo Valeri Chumakov, ele próprio detentor de uma parcela lunar. Os 700 hectares que comprou por 18,63 euros em 1997, valem hoje 155 mil, assegura o cronista do jornal ARGUMENTY I FAKTY, num artigo sobre o autoproclamado proprietário do astro, Dennis Hope. Segundo o Tratado de Exploração do Espaço da ONU, ratificado em 1967, nenhum Estado pode reivindicar a propriedade da Lua. Mas não há menção à propriedade privada, assegura Hope, que, em 1980, informou por correio os EUA, a União Soviética e a ONU das suas pretensões territoriais. À falta de resposta, o americano declarou-se proprietário dos planetas do Sistema Solar - excepto a Terra - e começou a vender parcelas extraterrestres. Até à data, garante a sua empresa, a Luna Embassy, conta já 3,4 molhões de compradores, incluindo "dois antigos presidentes dos EUA, seis famílias reais e 453 celebridades, entre os quais George Lucas, Harrison Ford e Clint Eastwood". Qualquer comprador torna-se automaticamente cidadão da Lua, diz o "Presidente plenipotenciário da face visível do astro". Mas "pode-se recusar esta cidadania".
(no Courrier Internacional, edição de Outubro 2009, nº 164, página 110)

Pronto, afinal comento:
Se não fosse a notícia que vou transcrever a seguir, eu ria-me desta, deste americanos loucos, sempre mais espertos do que os outros, sempre donos do mundo. Era mesmo capaz de pensar que era uma notícia do Dia das Mentiras.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Abaixo as famílias, é?...

É uma espécie de carta aberta:

Ó xô dôtôr Eduardo Sá, espero que a frase que a Visão publica na edição de 10 de Setembro de 2009, na página 108; e que a revista apresenta como sua, até a presenta na forma de citação,
pois espero que a frase assim ali reproduzida esteja "descontextualizada", espero mesmo que esteja muito bem "descontextualizada" (já viu como eu também consigo dizer palavas destas!...).
Ao que parece, o xô dôtôr fez brotar do alto da sua cátedra e da sua reflexão sapientíssima a afirmação (e passo agora eu a citar a citação), ao jornal I: "As famílias tradicionais estão, felizmente, à beira da extinção".
É claro que a gente não deve perguntar pela sua família, pois claro, é invadir o espaço que pertence à privacidade de cada um, pois é... desculpe-me até ter deixado passar isso no meu pensamento, até por que já o vimos uma vez almoçando num restaurante ali bem pertinho da cidade universitária do Mondego com uma companhia tal que, quem os visse - como foi o meu caso - poderia pensar: "Olha que lindo!... O pai, a mãe ao lado do pai, dum lado da mesa, e os fihos à volta deles."
Pois... pois é... a nossa família, na "esfera" da privacidade legítima. Pois... a nossa... mas as famílias dos outros, a gente pode dizer o que quiser. É porque não invadimos a tal esfera, não é?...
Imagine-me a ver o que digo que vi nesse tal restaurante depois de ler o que li já ontem na Visão. Imagine-me a comentar assim para o lado para a pessoa que comigo também ali almoçava: Olha, ali está o que parece ser uma família tradicional. Está em extinção. E sabes que mais - diria eu ainda para a minha companhia - felizmente que está em extinção!..."
É que o senhor sabe que a família está em extinção; e sabe também que ainda bem que está em extinção!
Peço-lhe um favor, quando um dia falar sobre gente que tem jeito para dizer coisas estúpidas e que faz gala em dizê-las fora da esfera, diga-me, eu vou logo ler! Até pode ser que leia lá qualquer coisa sobre mim que me faça bem. Obrigado!

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Jovens e saudáveis

Estava para não escrever nada sobre isto, mas a insistência nos nosso telejornais não acaba. Insistem nisto há dois ou três dias.
Conforme as conveniências jornalísticas, tanto um indivíduo com 16 ou 18 anos é um "homem", como - como é agora o caso - um indivíduo de 29 anos é insistentemente jovem.
E mais!... É saudável, pesa 120 quilos.
Páro. Ninguém percebe se eu estou embotado, ou se estou a pensar.
120 quilos é saudável?... Bom, o rapaz pode ter 2 metros de altura... Está bem, não insisto.
Mas 29 anos... jovem?... Bem, penso que o cartão jovem ainda continua a ir até aos 30 anos... Se calhar foi isso, viram-lhe o cartão jovem!...
Pois é, não há dúvida nenhuma: quem tem 29 anos é jovem e quem tem 120 quilos é saudável.
Bendita televisão que nos ensina estas coisas! E todos os dias!...

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Iluminado ou resignado?... - 2

Boaventura Sousa Santos também escreveu na edição do dia 27 de Agosto de 2009 da revista Visão. Um "radar ensaio", ou um ensaio na secção Radar... mesmo que no índice da revista venha na secção Opinião. Enfim.
Começa assim: "A minha coluna, intitulada A esquerda é burra?, suscitou polémica..."
Para mim, a haver polémica, é só sobre quem é que, afinal, é burro?... É a esquerda?... Sou eu?... Ou nem a esquerda ou nem eu?... Não me digam que o burro é...
Repare-se como o especialista das relações sociais escreve:
"Nestas eleições o eleitor comum de esquerda será um eleitor relutante, de dois tipos: o relutante-desiludido e o relutante-esperançado (...) Os próximos tempos vão decidir o "destino" deste eleitor-chave. Pode em eleições futuras não ser sequer um eleitor relutante-desiludido; pode mesmo ser um não-eleitor. Ou, pelo contrário, pode deixar de ser relutante e trazer para o seu campo da esperança os agora desiludios. Tudo depende da visão dos políticos de esquerda."
Não sei qual é a visão dos políticos de esquerda. Por mim, no que diz respeito à minha visão, sei que fiquei de olhos completamente trocados. E fiquei cheio de vontade de descobrir ensaios de Boaventura Sousa Santos que falem de charlatães, aldrabões e pantomimeiros.
Iluminado ou resignado? Como o outro, cá p'ra mim é dos acomodados.
São estes os homens sábios que provocam e estimulam o nosso pensamento sobre a "coisa política", sobre a nossa participação em actos de cidadania (como são os das eleições portuguesas que se avizinham)?
Como tantas vezes dizemos e ouvimos dizer: Espera aí, vou ali e já venho...
E lá vou, outra vez, de costados completamente vergados a tanta eloquência!...

Iluminado ou resignado?... - 1

Esta é da “Opinião” de Pedro Norton, na Visão, de 27 de Agosto de 2009:

“Há boas razões [Tanto que ele sabe: que há razões e que são boas!]… a principal é o perigo [Boa?... Perigo é "boa"?... E também não nos diz mais nenhuma!]… há também péssimas razões [Mais tanto que ele continua a saber! Que inveja, tanta sabedoria! Mas continua-se a não se saber quais são. Isso mesmo!, todas bem guardadinhas para si próprio!]… estou convencido disso por duas ordens de razões. A primeira é a irrefutável lei da matemática [Onde estão, a “irrefutável” e a matemática?]… tem portanto, na minha modesta opinião [Ui! Que gesto nobre de humildade!]… mas há mais uma conclusão a tirar… daqui se conclui que… [Quer dizer, a conclusão da conclusão, ou seja, a "metaconclusão"!] para o bem e para o mal, a questão é mesmo só de decidir entre Sócrates e Manuela. É tudo mesmo uma questão pessoal.”

E disse Pedro Norton!

Estou sem palavras!... Fiquei mesmo sem palavras!... C'um caneco!...

Se calhar, não é iluminado, nem resignado. Cá para mim, isto é mais acomodado…

Pudera! Dispor de um órgão de comunicação social assim a pagar-lhe para escrever coisas destas! Quem dera a tantos!

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Vamos todos abanar o capacete!

Hoje faz manchete (se calhar, estou a exagerar; se calhar deveria ter começado simplesmente assim: "Hoje tem sido notícia") em alguns órgãos de comunicação social, neste jardim que continua à beira-mar plantado:
"Com a gripe A a entrar nos planos curriculares deste ano, os estudantes vão ter que alterar hábitos e comportamentos: o aceno de cabeça vai substituir os tradicionais beijos e abraços."
Tão universitários!... Tão doutos!... Se calhar é já a gripe, na convulsão febril que às vezes ilumina em delírio as mentes sofredoras, a levar a sapiência a um nível nunca antes tão elevado!... O meu bonézinho, contorcido nervosamente nas mãos que também são minhas, geme com a intensidade da minha boca escancarada de espanto!...
Portanto, só vale abanar o capacete! Nada de acenos com as mãos (agita-se demasiadamente o ar) ou quaisquer outras quinestesias corporais suspeitas ou bruscas!

Proponho que se lance um concurso sobre os acenos de cabeça mais expressivos, em duas modalidades:
  • concurso de fotografia;
  • concurso literário (deverá conter obrigatóriamente a descrição escrita, pormenorizada, do aceno de cabeça).

Aceitam-se sugestões para prémios; e para a constituição do júri.

sábado, 4 de julho de 2009

Quero crer, diz o ministro Teixeira dos Santos

Para já, deixo-a aqui registada. A marinar...
Depois cá virei comentar.
Impressionante, para mim, o que esta afirmação encerra de intenção de querer convencer, sem se estar nada seguro do que se está a dizer.
O autor não quer vir a ser apanhado numa mentira ou num engano, mas quer convencer já, pelos tais intereses interesseiros da política e da economia, o Zé Povinho daqulio que ele próprio não sabe, e nem sequer acredita com muita convicção.
A frase:
Quero crer que estamos mais próximos do fim da crise que do seu início.
(Ministro Teixeira dos Santos, na Assemblei da República, em 1 de Julho de 2009)

Ó Senhor Ministro, toda a gente sabe, sem que para isso sejam necessários quaisquer extras de inteligência e bom senso, que, a partir do momento em que qualquer processo dinâmico se desencadeia (pronto, eu facilito o léxico: a parti do momento em que qualquer coisa de põe em movimento), fica-se sempre mais perto do fim do que do início.
Nem o senhor de La Palice, Senhor Ministro, diria melhor.
Aliás, ao que parece, ele - coitado! - nunca disse nada das coisas que hoje tantos de nós lhe atribuímos.
E mesmo o fadista António Mourão, por mais que ainda nos pudesse cantar o seu "Ó tempo volta p'ra trás" conseguiria inverter a direcção dos acontecimentos, não concorda, Senhor Ministro?

Noutra altura, em dia a chegar, não tanto por, eventualmente, me chegar o engenho e a arte, mas, isso sim, se considerar que vale a pena, discorrerei aqui sobre o Quero e o crer. É que, como resulta do que antes escrevi, para se estar mais perto do fim da crise do que do início, não é preciso nem querer, nem crer. Não é verdade, senhor Ministro?...
Então, se é assim, por que é que disse aquilo de maneira tão enfática?
Ó Senhor Ministro, o que quer mesmo do Zé Povinho?

sexta-feira, 1 de maio de 2009

As palavras que ditam (o Zé Povinho diria outra coisa...) sentenças

O que se pode fazer com as palavras é, simplesmente, tudo. Até se consegue atirar para cima do Zé Povinho, não só a bem convencida certeza de que os peixes são livres de viver fora de água, mas também a de que realmente o conseguem fazer.
O tema principal deste apontamento, bem eu o poderia escrever noutro dos meus blogues, com intenção instrutiva para os jovens e os meus colegas professores, bastaria para isso arrumar as palavras de maneira diferente. Além disso, o título desse blogue ("Na escola. Escrever quase na água") tem vestígios do centro da disputa jurídica de que vou falar a seguir: também eu "plagiei" Augusto Abelaira e os seus textos no semanário "O Jornal", jornal de que - outra curiosidade - o autor das palavras que vou copiar para aqui era o director.
Mas, pronto, desta vez decidi por menos pedagogia e por mais espanto absurdo.
A situação que conta José Carlos Vasconcelos é parente de uma outra que muito recentemente aconteceu comigo, numa sala de audiências, em que, se em vez de eu ter lá estado como testemunha abonatória, tivesse estado como réu, pois bem, garantidamente outro galo teria cantado, e o senhor doutor juíz bem poderia carregar as cores negras da sua sentença, justificado no protesto e na ironia mordaz do zé povinho que seguramente eu teria feito questão de ser. Mas como a sentença ainda não transitou em julgado, e há um jovem adulto a sério que é preciso ser protegido dos desmandos de um juiz de jeito social mais cego que a mais opaca das pedras, visto-me das minhas imaginárias roupas terra-a-terra do Sancho Pança e desabafo: "Deixa-o pousar... Palavras leva-as o vento... Não é com vinagre e com fel que se apanham moscas..."
Ora o que conta J. C. de Vasconcelos?
O seguinte, na edição da Visão, de 30 de Abril de 2009, na página 40, falando de 25 de Abril, liberdade e jornalismo:
"(...) Acontece é haver quem abuse daquele direito [recorrer aos tribunais] e processe jornalistas senm nenhum fundamento, causando-lhe prejuízos e incómodos que só por si representam uma punição. [eco emocional n.º 1: de empatia da minha parte, "Estou consigo, Zé Carlos."] Casos nítidos, são numerosos processos intentados na Madeira, obrigando a custosas deslocações e estadas de que depois os arguidos, mesmo absolvidos, não são ressarcidos [eco n.º 2: "Como eu o compreendo!... É verdade!...]! Há, aliás, casos incríveis, e magistrados com insólitos [eco n.º 3, a este eufemismo, ou mariquce de fala ou de escrita compreensível: "E se a gente usa um palavreado assim mais arrevezado, aqui d'el-rei, que se ofendeu a dignidades de certas pardas eminências!"] pontos de vista... Dou um exemplo pessoal. Uma senhora, professora! [eco n.º 4, já estou a ver o meu juiz a dizer "Estão a ver?... Eu tenho ou não tenho razão!?... É por isso que o ensino está como está!..."], plagiou um poema [eco n.º 5, "Desculpe-me lá, senhor Augusto Abelaira..."]. Uma estudiosa do poeta soube e denunciou o plágio. A senhora, que viria a ser condenada penalmente [eco n.º 6, "Boa!..."], processou a autora do texto e a mim, como director do jornal, pedindo-nos uma avultada indeminzação, por atentar contra o seu "bom nome"! [eco n.º 7, de espanto e incredulidade: "Então a senhora dona do bom nome plagiou ou não a poeta autora?... E plagiar é feio, não é?..."] Em reconversão, tentando iniciar uma jurisprudência que se impõe, eu pedi uma pequena indemnização pelos danos que me causou o incrível processo. Resultado: a autora do texto e eu fomos absolvidos, tinha de ser, [eco n.º 8, "Claro!..."] mas a plagiadora também [eco n.º 9: mais espanto, mais incredulidade. Eco n.º 10: "Onde é que eu já ouvi que o crime compensa?..."] E no acordão da Relação escreveu-se que o director (eu) "não podia deixar de colocar no seu horizonte a eventualidade de poder ser-lhe movida uma acção como a presente (...), podendo até afirmar-se que tal constitui um risco inerente ao exercício das funções ainda que exercidas, como será o caso, com estrita observância dos princípios éticos e deontológicos"... [eco emocional n.º 11: "Não tenho palavras!... Estou esmagado, na minha funda ignorância visceral, com o peso de tanta palavra sábia... e sabiamente judiciosa (ou judicativa, não sei bem... cá estou eu às voltas com a minha ignorância visceral)!..."]
Dr. José Carlos de Vasconcelos, no fim disto tudo, a única coisa que não percebo é o que é que a Madeira tem a ver com isto... O caso passou-se na Madeira, ou não?... É que isso de despesas grandes dá para a Madeira, dá para os Açores, dá para qualquer tribunal longe no continente. Eu não saí de Lisboa e só para um pequeno testemunho de 10 minutos fui ao Tribunal 4 vezes, 1 dia inteiro e mais três tardes inteiras!... A faltar à escola... a engrossar as estatísticas do absentismo ("baldas", para os zés povinhos) dos professores às aulas!...

segunda-feira, 27 de abril de 2009

O que os ovos-moles tiveram de mudar para poderem ficar precisamente na mesma

Fui buscar esta notícia à edição on line de hoje do Público:

Foram vários os caprichos da União Europeia que, por exemplo, roubou aos ovos-moles a possibilidade de se aconchegarem em tabuleiros de madeira e os fez acamar em desconfortáveis grelhas de inox. Mas este mês chegou a hora da retribuição. As mais antigas e tradicionais doceiras, como a dona Silvininha, podem dormir descansadas, que a receita original já está protegida pela lei.
Por Graça Barbosa Ribeiro (texto) e Paulo Pimenta (fotos), 27.04.2009.

De touca a prender-lhe os cabelos, com a bata vestida e protecções de plástico nos sapatos, Maria João Santos, de 35 anos, franze os olhos num sorriso. "Deste lado a São, a encher as formas; ali, ao canto, o avô Carlos, a prensar as hóstias; e aqui a avó Quinhas, já muito velhinha, a recortar..." À medida que fala, vai apontando para diferentes lugares vazios em torno de uma mesa de tampo asséptico. Mas o que ela vê a unir todas aquelas personagens já desaparecidas é uma pesada e centenária mesa de madeira.
Dona Silvininha (que é como todos tratam Silvina da Silva Raimundo, frágil nos seus 81 anos de idade) segue com o olhar aquilo que o dedo de Maria João aponta. Detém-se na mesa – "Só para a lavar era meia hora, todos os dias, ao fim da tarde. Meia hora a esfregar, a esfregar, com sabão azul, até ficar impecável", diz. E depois cala-se.
Por momentos, quedam-se ambas nesse outro tempo, as duas mulheres que à vez – uma há 27 anos e outra há meia dúzia – arregaçaram mangas para manterem viva uma das mais antigas casas de Aveiro de produção artesanal de ovos-moles.
Ainda travam batalhas juntas e ambas celebraram a última, ganha a 8 de Abril, quando se soube que os ovos-moles se tinham tornado o primeiro doce conventual do espaço comunitário a integrar a lista de produtos agrícolas e alimentares com a denominação de "indicação geográfica protegida".
Significa isto que a legislação europeia – que lhes levou as colheres de pau, os alguidares de barro vidrado e a tal mesa de madeira – pagou, finalmente, o seu tributo, passando a assegurar que não se produz aquele doce senão aqui, na região de Aveiro; e que ninguém o confecciona senão como nesta casa, da forma tradicional. Mas não é nisso que pensam agora, que se calam as duas e vêem, quando olham para a mesa de tampo asséptico, aquilo que mais ninguém vê.
O silêncio é curto. Maria João dá uma gargalhada e abana a cabeça, como que a afastar a memória guardada pela garota que corre de um lado, numa brincadeira perigosa, a rasar os alguidares de água quente e as panelas de cobre onde o doce de ovos ainda borbulha, a ferver.
A garota cresceu: Maria João é agora a gerente da casa. Aquele espaço, antigamente uma saleta da residência da família de Silvininha, a proprietária, tem hoje o nome de "laboratório"; e nem os filhos das empregadas (como Maria João, em menina) nem quaisquer outras crianças (como os netos de Silvininha, mais tarde) podem entrar, quanto mais correr, por entre as doceiras, que hoje trabalham escondendo as faces rosadas por trás de severas máscaras de cirurgião.
Mas nem tudo mudou. Apesar do estrito cumprimento das normas de segurança e de higiene alimentar (que fizeram deitar paredes abaixo, renovar pisos, substituir tampos e queimar os enormes tabuleiros de madeira), este centro de produção artesanal está longe da imagem que associamos à palavra "laboratório".
Segredo dos conventos
De alguma forma, o espaço ainda tem alguma coisa de casa de família, o que é reforçado pela localização quase secreta e aparentemente nada favorável ao único posto de venda dos doces que ali se produzem. "No centro da cidade de Aveiro, procura a Igreja de Vera Cruz, corta à esquerda e percorre toda a rua também pelo passeio esquerdo até encontrar uma porta de garagem branca", indicam.
Felizmente, há uma placa discreta na parede: "Maria da Apresentação da Cruz, Herdeiros." Dona Silvininha acrescentou-lhe "casa fundada em 1882", um bocadinho ao acaso. "Até talvez seja mais antiga", diz, na saleta de entrada, a antiga garagem.
A parede da direita foi demolida, para construir o balcão onde está exposta a doçaria. E o lugar antes ocupado pelo automóvel está hoje decorado com fotografias de família, que contam a história da casa que é também a história de mulheres de diferentes gerações. Rezam a História e a lenda que foi por ocasião da extinção das ordens religiosas que a receita dos ovos-moles se escapou dos conventos. Talvez se tenham sentido desobrigadas de manter o segredo as senhoras que antes ajudavam as freiras a dar uso aos ovos que ali entravam com fartura, para pagamento de rendas.
Quantas foram as ajudantes que nas suas casas ousaram repetir os gestos das religiosas, cozinhando o doce alaranjado e envolvendo-o, a seguir, na massa de que eram feitas as hóstias? Não se sabe ao certo, apesar do esforço de investigação feito por iniciativa da Associação dos Produtores de Ovos-moles de Aveiro, à qual cabe, também, o mérito do reconhecimento da marca pela União Europeia.
Certo é que Silvina da Silva Raimundo foi um dos elos da cadeia. E que, antes dela, o foram a sua sogra, Maria da Apresentação da Cruz; e a tia desta, Odília dos Anjos Soares, que por sua vez aprendera a fazer ovos moles, conta-se, com Maria Encarnação Mourão, que em solteira trabalhou num convento e depois, por via do casamento, se tornou proprietária de uma confeitaria fina.
Era para a Confeitaria Mourão, mais conhecida por "Costeira", que trabalhava Odília; e foi para a mesma casa que depois produziu a herdeira da receita e do negócio, a sua sobrinha Maria da Apresentação, que na terra era conhecida por "dona Marquinhas".
Silvina anuncia que vai contar uma história triste. A do dia, há 27 anos, em que a família soube que a "Costeira", a única para onde produziam ovos-moles, ia fechar. Chocada, dona Marquinhas avisou que, se tal se confirmasse, morria. E o que é certo, diz Silvina, é que a sogra não resistiu mais um mês, depois de a confeitaria encerrar.
Foi entre uma coisa e outra que se deu o acontecimento improvável de Silvina, professora primária numa escola a dois passos de casa, ter prometido à sogra, que via a morrer de desgosto, que desse por onde desse havia de salvar a receita e o negócio. Uma imprudência, achou o marido de Silvininha, o senhor Carlos, que depois da morte da mãe se opôs ao cumprimento da promessa o quanto pôde, mas não o suficiente.
Silvina da Silva Raimundo diz que teve a sorte a seu favor. A conceituada Maria de Lourdes Modesto já revelara, num dos seus livros, que os melhores ovos-moles de Aveiro, vendidos na "Costeira", eram feitos na casa de Maria da Apresentação. E talvez isso tenha contribuído para que o encerramento da confeitaria e a morte da doceira tenham despertado o interesse da Rádio Renascença, que mandou um repórter entrevistar Silvina. Dali à RTP foi um pulo. E assim começaram a surgir os clientes – os da terra e os forasteiros – que, saudosos dos "melhores ovos-moles de Aveiro", procuravam a Igreja de Vera Cruz, seguiam, atentos, pelo passeio esquerdo, e batiam, espantados, à porta da garagem, passando, finalmente, entre o automóvel e a parede, até chegar à segunda porta, a do lugar de fabrico.
Peixes, búzios e conchas
Foi uma luta. E dona Silvininha não quis que outros, depois dela, tivessem de travar uma também; ou que, pior do que isso, o não fizessem e a casa desaparecesse com a sua morte. Os filhos, médicos, não tinham vocação para o negócio, pelo que não asseguravam a sua continuidade. Mas Maria João, demasiado crescida para correr por entre os aventais das doceiras, mantivera-se, interessada e prestável, sempre por perto, ao longo de toda a adolescência.
Começara por ajudar, apenas; depois, já adulta, por lá trabalhar, estudando ao mesmo tempo; até que, um dia, a pedido de Silvina, se entregou definitivamente à casa e à causa. A legislação trazia novas exigências e ela abandonou o curso superior de Contabilidade para se dedicar, a tempo inteiro, à mudança que era necessário fazer para que o essencial – a receita tradicional – ficasse precisamente na mesma.
O seu dinamismo impressionou Silvina. Apesar do aspecto frágil, não era mulher para esperar que, no leito de morte, alguém lhe prometesse salvar o negócio; ou para arriscar que ninguém o fizesse... De maneira que, para além dos filhos e dos netos, fez suas sócias Maria João e Conceição Laranjeira, que ali entrou como empregada aos 12 anos de idade, e é hoje, aos 48, uma das mais experientes doceiras de Aveiro.
São elas que, junto de dona Silvininha, acabam por baixar as máscaras que lhes tapam os rostos, como quem baixa as armas. Se hoje a cadeia de produção pode ser toda fotografada – do partir dos ovos, ao recorte dos peixes, búzios e conchas, passando pela cozedura em panela de cobre – é porque, actualmente, todos os produtores sabem que não podem dispensar a promoção dos seus doces, confessam.
Porque, na verdade, diz Conceição Laranjeira, o enchimento das formas, o prensar das hóstias e o recorte dos doces costuma ser feito à tarde, por todas elas, em redor da mesa. "Como antigamente", acrescenta Maria João, que diz que "parece que os está a ver", aos velhos patrões da sua mãe, a quem chamava avós, e à velhinha Conceição, que morreu no posto de trabalho com 90 anos feitos. Calam-se as três, a sorrir. E, depois, Maria João franze os olhos e aponta: "Deste lado a São, a encher as formas; ali, ao canto, o avô Carlos, a prensar as hóstias; e aqui a avó Quinhas..."

domingo, 26 de abril de 2009

Nuno Álvares Pereira, no dia a seguir ao 25 de Abril

Hoje de manhã, ao pequeno-almoço, tinha a televisão sintonizada na SIC Notícias e dei atenção à "peça" jornalística sobre a canonização de Nuno Álvares Pereira. Mais uma vez, a velha querela (guerra, confronto ou teima, para os zés povinhos) entre o Estado laico e a Igreja secular. Como é?... Afinal, Nuno Álvares Pereira é herói porque enfardou forte e feio nos castelhanos, ou é santo porque curou a maleita do olho de uma senhora que tinha muita fé nele? Bem, adiante...
Confesso que quis ouvir com atenção a mensagem do Presidente da República, que a reportagem foi buscar ao sítio da Presidência da República na Internet. Assim que acabei o pequeno-almoço, atirei-me à Internet. Sim, lá estava a mensagem, preto no branco, todas as palavras escritas; vídeo e tudo!...
Senhores!... Abismei!... Fiquei de queixo caído!... Juro!, pela saúde destes olhinhos que a terra há de (pelo menos aqui, a grafia está já de acordo com o que vem novo Vocabulário, calhamaço que folheei há dias; é assim agora, sem hífen) comer!
Eu peço desculpa a toda a gente (não vá eu, se o não fizer, esquecer-me de alguém...), mas tenho o pensamento toldado pela emoção e não consigo escolher nem organizar as palavras para que este meu escrito seja mais substantivo que adjectivo, ou que seja menos crispado e mais programático. Que todos os paulos portas da nossa política me perdoem!...
Então não é que depois da sessão solene de ontem, em que toda a gente falou de crise ECONÓMICA, que tanta gente (o Senhor Presidente da República incluído) deixou recados POLÍTICOS, o Senhor Presidente da República vem hoje (menos de 24 horas depois!...) dizer que o exemplo de Nuno Álvares Pereira, o exemplo de "o forte Dom Nuno" - diz ele, citando Camões (olhem logo quem ele foi buscar!...) - é um exemplo "muito em particular, para as nossas Forças Armadas"!?... É verdade, senhores, pasmei!...
Esperem aí!... Então, ontem, como já disse, menos de 24 horas antes do que hoje foi oficialmente publicado, ele não esteve numa sessão solene, no espaço físico, público, mais simbólico da identidade política do nosso País, a dizer que a crise é económica, a lançar recados aos políticos e a homenagear o exemplo de 35 anos... precisamente dos Capitães de Abril (quer dizer, das Forças Armadas)!?... 
Se calhar também quem nos governa também deixa o pensamento claro e objectivo ser invadido pela névoa das emoções, e atire a discussão da canonização de hoje para alternativas de preto ou branco: ou herói militar, ou santo milagreiro.
Confesso que pouco me importa a canonização ou não de Nuno Álvares Pereira. Já há muito que a sua vida deveria ser inspiração e exemplo para muita gente governante do nosso País. Se a canonização tornar mais forte essa inspiração e esse exemplo, pois então, seja.
Portanto, se a crise é económica, se os avisos de ontem, dia 25, são para os políticos, se as notícas que todos os dias nos chegam a casa são as da corrupção e do enriquecimento ilícito de quem se move nas esferas do poder político e económico, não  teria sido mais razoável que o Senhor Presidente da República destacasse o exemplo da renúncia do forte Dom Nuno às honras do Reino e aos bens materiais e a sua dedicação sincera, humilde e inteiramente despojada de confortos materiais a uma vida de serviço ao Próximo? Que tivesse  destacado estes exemplos "mais em particular, para os senhores deputados, membros do Governo e outros poderosos", que tanta legitimação pedem ao povo de Nuno Álvares Pereira, ciclicamente, em actos eleitorais (este ano vai ser uma barriga cheia de legitimação!)?

P.S. - Acabei de ouvir o Santo Padre a falar de Nuno de Santa Maria Álvares Pereira. Curiosamente, exemplarmente, não teve problemas nenhuns em falar do guerreiro e do santo.
Afinal, de quem foi poderoso, rico e honrado; e se tornou completamente desprotegido, pobre e ainda mais honrado!

sábado, 25 de abril de 2009

"25 de Abril, sempre!", edição de 2009

Ouvi na íntegra e em directo o discurso oficial do Senhor Presidente da Assembleia da República, na sessão solene comemorativa do 25 de Abril.

No meu entender, foi o discurso absolutamente perfeito, em tempo de crise nacional e mundial, da casta política dominante que - parafraseando Miguel Torga - colhe hoje (desonestamente?...) o que os capitães de Abril sonharam (genuinamente?...) ontem. Foi uma prosa muito bem compostinha de auto-protecção, de auto-justificação e de auto-elogio, perante o povo português, do alto da tribuna cujo manejo (interesseiro?...) está muito bem apurado.

Não faltou sequer o tom grave dos grandes princípios e obrigações morais, atirados assim para ficarem a pairar solenemente sobre as cabeças de todos os presentes e, dessa forma, responsabilizando, na verdade... ninguém!. Mas a imagem e a palavra ficaram bem compostas nos rostos de todos, muito graves e sérios, e espalhando tanta gravidade e seriedade a todos nós, o País inteiro!, pelos jornais, pelas televisões e pelas rádios.

No final (e segundo me apercebi pela transmissão radiofónica que fui escutando enquanto conduzia), foi um lamentável corropio de passos apressados ao pé dos órgãos de informação e comunicação social, procurando posicionamento privilegiado em relação a uns e esquivamento conveniente a outros... Parece que baias, estrategicamente colocadas, deram muito jeito...

Como já vem também tornando-se hábito, os deputados e restantes presentes foram poupados ao Hino Nacional. Antes que se cansassem do esforço vocal, antes que desafinassem, o coro contratado para o efeito cantou o Hino por todos. Depois, com parcimónia grave e solene, os deputados bateram as palmas.

O resto, sintetizo nestas palavras prodigamente repetidas por Paulo Portas: que as discussões no hemiciclo, que as discussões entre os deputados têm de ser mais substantivas e menos adjectivas!... Que as discussões têm de ser mais programáticas e menos crispadas!...

Imagino Bordalo Pinheiro e o velho Zé Povinho (em que estão tentanto tornar-nos a todos outra vez) a olharem Paulo Portas, ou qualquer outro deputado, Bordalo e Zé Povinho de boca e olhos bem abertos, completamente siderados com tanta sapiência. Que verbo!... Quem fala assim não é gago! Ei, valente!... Pois é, por isso é que Paulo Portas é deputado e eu não, é porque ele sabe dizer que as discussões têm de ser "substantivas", "adjectivas", "programáticas", "crispadas", e eu não!

Triste fado, este, a que tornámos 35 anos depois de um sonho lindo!...