sexta-feira, 1 de maio de 2009

As palavras que ditam (o Zé Povinho diria outra coisa...) sentenças

O que se pode fazer com as palavras é, simplesmente, tudo. Até se consegue atirar para cima do Zé Povinho, não só a bem convencida certeza de que os peixes são livres de viver fora de água, mas também a de que realmente o conseguem fazer.
O tema principal deste apontamento, bem eu o poderia escrever noutro dos meus blogues, com intenção instrutiva para os jovens e os meus colegas professores, bastaria para isso arrumar as palavras de maneira diferente. Além disso, o título desse blogue ("Na escola. Escrever quase na água") tem vestígios do centro da disputa jurídica de que vou falar a seguir: também eu "plagiei" Augusto Abelaira e os seus textos no semanário "O Jornal", jornal de que - outra curiosidade - o autor das palavras que vou copiar para aqui era o director.
Mas, pronto, desta vez decidi por menos pedagogia e por mais espanto absurdo.
A situação que conta José Carlos Vasconcelos é parente de uma outra que muito recentemente aconteceu comigo, numa sala de audiências, em que, se em vez de eu ter lá estado como testemunha abonatória, tivesse estado como réu, pois bem, garantidamente outro galo teria cantado, e o senhor doutor juíz bem poderia carregar as cores negras da sua sentença, justificado no protesto e na ironia mordaz do zé povinho que seguramente eu teria feito questão de ser. Mas como a sentença ainda não transitou em julgado, e há um jovem adulto a sério que é preciso ser protegido dos desmandos de um juiz de jeito social mais cego que a mais opaca das pedras, visto-me das minhas imaginárias roupas terra-a-terra do Sancho Pança e desabafo: "Deixa-o pousar... Palavras leva-as o vento... Não é com vinagre e com fel que se apanham moscas..."
Ora o que conta J. C. de Vasconcelos?
O seguinte, na edição da Visão, de 30 de Abril de 2009, na página 40, falando de 25 de Abril, liberdade e jornalismo:
"(...) Acontece é haver quem abuse daquele direito [recorrer aos tribunais] e processe jornalistas senm nenhum fundamento, causando-lhe prejuízos e incómodos que só por si representam uma punição. [eco emocional n.º 1: de empatia da minha parte, "Estou consigo, Zé Carlos."] Casos nítidos, são numerosos processos intentados na Madeira, obrigando a custosas deslocações e estadas de que depois os arguidos, mesmo absolvidos, não são ressarcidos [eco n.º 2: "Como eu o compreendo!... É verdade!...]! Há, aliás, casos incríveis, e magistrados com insólitos [eco n.º 3, a este eufemismo, ou mariquce de fala ou de escrita compreensível: "E se a gente usa um palavreado assim mais arrevezado, aqui d'el-rei, que se ofendeu a dignidades de certas pardas eminências!"] pontos de vista... Dou um exemplo pessoal. Uma senhora, professora! [eco n.º 4, já estou a ver o meu juiz a dizer "Estão a ver?... Eu tenho ou não tenho razão!?... É por isso que o ensino está como está!..."], plagiou um poema [eco n.º 5, "Desculpe-me lá, senhor Augusto Abelaira..."]. Uma estudiosa do poeta soube e denunciou o plágio. A senhora, que viria a ser condenada penalmente [eco n.º 6, "Boa!..."], processou a autora do texto e a mim, como director do jornal, pedindo-nos uma avultada indeminzação, por atentar contra o seu "bom nome"! [eco n.º 7, de espanto e incredulidade: "Então a senhora dona do bom nome plagiou ou não a poeta autora?... E plagiar é feio, não é?..."] Em reconversão, tentando iniciar uma jurisprudência que se impõe, eu pedi uma pequena indemnização pelos danos que me causou o incrível processo. Resultado: a autora do texto e eu fomos absolvidos, tinha de ser, [eco n.º 8, "Claro!..."] mas a plagiadora também [eco n.º 9: mais espanto, mais incredulidade. Eco n.º 10: "Onde é que eu já ouvi que o crime compensa?..."] E no acordão da Relação escreveu-se que o director (eu) "não podia deixar de colocar no seu horizonte a eventualidade de poder ser-lhe movida uma acção como a presente (...), podendo até afirmar-se que tal constitui um risco inerente ao exercício das funções ainda que exercidas, como será o caso, com estrita observância dos princípios éticos e deontológicos"... [eco emocional n.º 11: "Não tenho palavras!... Estou esmagado, na minha funda ignorância visceral, com o peso de tanta palavra sábia... e sabiamente judiciosa (ou judicativa, não sei bem... cá estou eu às voltas com a minha ignorância visceral)!..."]
Dr. José Carlos de Vasconcelos, no fim disto tudo, a única coisa que não percebo é o que é que a Madeira tem a ver com isto... O caso passou-se na Madeira, ou não?... É que isso de despesas grandes dá para a Madeira, dá para os Açores, dá para qualquer tribunal longe no continente. Eu não saí de Lisboa e só para um pequeno testemunho de 10 minutos fui ao Tribunal 4 vezes, 1 dia inteiro e mais três tardes inteiras!... A faltar à escola... a engrossar as estatísticas do absentismo ("baldas", para os zés povinhos) dos professores às aulas!...