quarta-feira, 12 de agosto de 2015

OS VEZES E OS REVEZES DO IDEAL EUROPEU - 010. TÃO TRISTE ME DEIXA A SATISFAÇÃO DE JEAN MONNET

Jean Monnet, como facilmente se entende, é celebrado, homenageado, até glorificado, por uns; mas também tem os outros - os detractores, os acusadores, os críticos. Talvez a mais agreste de todas as acusações seja a de ser um francês, um europeu, a soldo dos Estados Unidos da América, em resultado de um fascínio quase hitleriano por Roosevelt. (agreste é agreste...)
Até ver, tanto quanto sei, não têm razão estes agrestes críticos de Monnet.
São claros, na sua autobiografia, os testemunhos de apreço, respeito e admiração de Jean Monnet por Roosevelt.
É precisamente do intenso relacionamento que Monnet mantém com o "general" Presidente dos E.U.A. que resulta este tão triste - para mim, é claro, mesmo que o entenda no seu contexto - enumerar do que, logo a seguir, Monnet comentou assim:
«Desde esse dia, mais do que em qualquer outro momento da minha vida, senti a satisfação de ter contribuído para uma decisão que modificaria o curso dos acontecimentos.» (Memórias, Ulisseia, 2004 (1976), p. 178) (1)
Tenho a cada vez mais firme convicção de que Monnet foi um incansável lutador a favor da Paz, da Cooperação e da Solidariedade; mas, do ponto de vista da História dos Homens, o motivo, o conteúdo de tanta satisfação é absolutamente lamentável. É quase obsceno. A este, alguns parágrafos à frente, Monnet traz outra... "obscena" inventariação.
A primeira enumeração:
«[Roosevelt] Não escondeu nada à opinião pública sobre os objectivos de produção militar: sessenta mil aviões de todos os tipos em 1942, cento e vinte e cinco mil em 1943, quarenta e cinco mil mil carros de combate, seguidos de mais setenta e cinco mil, oito milhões de toneladas de embarcações - em suma, os mais audaciosos números que tinha retirado das nossas sugestões. Tão pouco dissimulou as consequências daí decorrentes: "a produção do país deve ser aumentada muito acima do seu nível actual, mesmo que isso signifique uma perturbação na existência do emprego de milhões dos nossos concidadãos".» (p.178) (1)
O "esforço" do armamento militar actual. (2011)
Fonte: http://www.washingtonsblog.com/2014/05/90-deaths-war-civilians.html
Ora, se pensarmos que também os alemães, os russos e os japoneses se empenhavam intensamente no armamento militar, teremos uma ideia de como, em resultado da loucura de tão poucos homens, tanto da humanidade e dos recursos ambientais eram postos ao serviço da pura destruição!... É esse o meu grande lamento.
Como disse antes, algumas páginas mais à frente, Monnet prossegue a apresentação da "obscenidade" e da satisfação pessoal for estar envolvido nela.
Não, senhores detractores de Jean Monnet, não estou do vosso lado. Lamento a Guerra, todas as guerras; e quando, desde logo na Primeira Guerra, Monnet almejava e fantasiava na sua mente a aliança, não entre amigos, mas também com os inimigos, era para prevenir que algum dia este uso obsceno dos recursos dos recursos da Terra pudesse acontecer. A seu tempo, falaremos do que Jean Monnet pensou e sentiu sobre o lançamento das bombas em Hiroshima e Nagasaki, num tempo que já não era de Roosevelt, era de Truman.
A segunda enumeração:
«O facto de a produção de aviões de guerra, insignificante em 1940, se ter aproximado, quando se procedeu a um balanço total no dia da vitória, do número fabuloso de trezentos mil aparelhos, o facto de cem mil carros de combate terem saído sem contratempos das fábricas de automóveis em período de crise, de cento e vinte e quatro mil barcos terem saído dos estaleiros que tinham estado adormecidos durante a recessão, de dois milhões e setecentas mil metrelhadoras terem saído das fábricas e de quatrocentos e trinta milhões de toneladas de aço terem saído dos altos-fornos; o facto de, em suma, a economia de um país ter conseguido em tão pouco tempo assumir tal dinâmica só pode parecer evidente a quem acredita que o poderio dos Estados Unidos é um dado natural. Sem dúvida, o que é natural nos americanos é a organização e a expansão. Mas esta disposição de espírito não dispensa o esforço e a disciplina. Só se torna activa quando é desenvolvida por homens enérgicos e responsáveis. Eu pretendi viver no meio destes homens e tive a felicidade de poder inspirar, por vezes, a sua acção.» (p. 181) (2)
(1) «Il ne cacha rien au monde des objectifs de production militaire : soixante mille avions de toutes sortes en 1942, cent vingt-cinq mille en 1943, quarante-cinq mille, puis soixante-quinze mille chars, huit millions de tonnes de bateaux – bref, les chiffres les plus audacieux qu'il avait retenus de nos suggestions. Il n'en dissimula pas non plus les conséquences : « La production de ce pays doit être relevée largement au-dessus de son niveau actuel, même si cela signifie une perturbation dans l'existence et dans l'emploi de millions de nos concitoyens. Ce jour-là, plus qu'à aucun autre moment de ma vie, j'éprouvai la satisfaction d'avoir contribué à une décision qui changerait le cours des évènements.»

(2) «Que la production d'avions de guerre, insignifiante en 1940, ait approché lorsqu'on en fit le bilan total au jour de la victoire le chiffre fabuleux de trois cent mille appareils; que cent mille tanks soient sortis sans à-coups des usines d'automobiles en crise, cent vingt-quatre mille bateaux des chantiers endormis dans la récession, deux millions sept cent mille mitrailleuses des fabriques, quatre cent trente millions de tonnes d'acier des hauts fourneaux; que l'économie d'un pays ait pu en si peu de mois prendre un aussi grand essor ne paraît évident qu'à ceux qui croient que la puissance des États-Unis est une donnée naturelle. Sans doute, ce qui est naturel aux Américains est l'organisation et l'expansion. Mais cette disposition d'esprit ne les dispense pas de l'effort et de la discipline. Et elle ne devient pas active sans être entraînée par des hommes énergiques et responsables. J'ai voulu vivre au millieu de ces hommes et j'ai eu le bonheur de pouvoir inspirer quelques fois leurs actions.»

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