segunda-feira, 4 de novembro de 2019

As razões do ódio: Extremismos - 4.º episódio da série de Spielberg

Jesse Morton, que se tornou muçulmano radical, rebaptizando-se com
outro nome; e depois abandonou o radicalismo islâmico após
uma fascinante experiência de trabalho para um patrão judeu.
Do quarto episódio: Extremismos

  • A mensagem deste muito eficaz vídeo é simples, tal como no 3.º episódio: qualquer um de nós pode, sem que disso se dê conta, num curto espaço de tempo, ser protagonista de comportamentos extremistas, violentos, sozinho ou em bandos.
  • Verdadeiramente, o problema não está na natureza das pessoas, mas nos papéis sociais que as pessoas têm, ou realizam, nos seus grupos de pertença.
  • As pessoas coadunam-se naturalmente às exigências dos papéis que lhes são atribuídos..
  • A principal fragilidade que põe qualquer pessoa em risco de adesão a grupos radicais e violentos é a ausência ou perda de sentimento de pertença a uma comunidade (ver o que escrevi a propósito do episódio 2, sobre o Tribalismo). Os membros dos grupos radicais, extremistas, encontram no grupo o que não encontram na família, na escola e na comunidade de pertença: os laços de união, a comunhão, o sentimento de partilha e de pertença.
Alguns comentários pessoais:
  1. No fundo, desde o primeiro instante do documentário, o alerta é o que nos traz o Die Welle (A Onda), o filme alemão de 2008 realizado  por Dennis Gansel e inspirado nos acontecimentos verídicos protagonizados nos E.U.A. pelo professor de História Ron Jones e os seus alunos, nos anos 60 do século XX. Aliás, Ron Jones acompanhou a produção, aconselhou e protagonizou este extraordinário filme, que passo todos os anos aos meus alunos de Psicologia, desde que o filme apareceu legendado em Português.
  2. Diz, no Die Welle, o aluno que faz soar o alerta na consciência do professor: «O que aconteceu na Alemanha nazi é impossível acontecer agora connosco, estamos todos agora muito bem informados e alertados». Ora a questão central não é do foro da cognição e da informação; isso sim, é do foro do afecto e do sentimento de pertença ou comunhão. No filme, os miúdos reclamam a necessidade de sentir a "mannshaft" (o grupo, a equipa).
  3. O filme mostra de forma arrepiantemente realista que a mudança pessoal não precisa sequer de uma semana, obrigando a rever todos os conhecimentos estudados na Psicologia Social experimental, que tinha apurado períodos de tempo muito mais longos.
  4. Volto ao impressionante registo cinematográfico de Claude Lanzmann para sinalizar que, na última cena de conversa colectiva, à porta da igreja de Chelmno, que juntou o "velho" miúdo de 13 anos, judeu, que se safou da morte por ter uma voz linda para cantar para as tropas alemãs, aos agora idosos da aldeia que ainda se lembravam dele, a cena parece que é cortada abruptamente. E isso não aconteceu, seguramente, por acaso! É que a conversa, no seu desenvolvimento natural, encaminhou-se para trazer de volta aos aldeões polacos os ancestrais ressentimentos dos cristão contra os judeus que acusaram Cristo e o levaram à crucificação; e houve o bom senso de a parar. Parece mesmo que, mais um pouco, e aquelas pessoas deixadas à sua simplicidade e ao seu baixo nível cultural, voltariam a entregar o pobre judeu aos nazis alemães. Pessoas simples, reféns da (de)formação cultural inculcada séculos e séculos - e que só uma sábia e assertiva pedagogia, com a concreta transformação positiva das condições de vida das pessoas, pode amaciar, ou mesmo eliminar. É verdade: os velhos ódios, reais ou imaginados, idealizados ou negativamente mitificados, na falta de domínio pessoal da informação e da adequada maturidade cívica e cultural estão sempre prontos a irromper outra vez.

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(1) Ver na Euronews:
https://pt.euronews.com/2019/11/01/nova-lei-de-controlo-da-internet-entra-em-vigor-na-russia

(2) Shoah, 4*DVD, Midas Filmes, Portugal, 2013.

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